A pretexto de aniquilar o grupo Hamas, como punição à ação terrorista realizada por este partido em 7 de outubro de 2023, que matou mais de 1000 pessoas, a maioria civis, e sequestrou mais de 200 em território israelense, o primeiro ministro de Israel, Netanyahu, apoiado por seu governo, declarou guerra e iniciou uma matança sem precedentes e sem justificativas na faixa de Gaza. São, segundo órgãos independentes, mais de 50 mil palestinos mortos, a maioria mulheres, e milhares de bebês menores de 5 anos, crianças, adolescentes, idosos, hospitalizados em tratamento e profissionais de saúde que atendiam em hospitais bombardeados. Israel, que no início da Guerra não reconhecia os ataques a hospitais, hoje os justifica com o argumento de que lá se escondiam terroristas. É trágico e estarrecedor um Estado declarar que para matar alguns terroristas assassina uma população civil e crianças amamentando-se no seio das mães. O choro do embaixador da Palestina, Riyad Mansour, ao bater na mesa e protestar pelas mortes de crianças, que estão passando fome por Israel não permitir ajuda humanitária para a população civil, expressa a tristeza e o sofrimento de inocentes de um lado e do outro a iniquidade, fruto do crime de guerra empreendido pelo atual governo de Israel.
O vigário da Custódia da Terra Santa, Ibraim Faltas, abre assim o seu artigo no Vatican News: “O nome do único sobrevivente dos irmãozinhos que morreram em Gaza é Adam. Ele ficou sozinho: os seus nove irmãos mais novos perderam a vida de forma trágica e violenta. E, nesta manhã, um ataque aéreo atingiu uma escola e um vídeo mostra uma menina tentando escapar das chamas que estão prestes a envolvê-la. Crianças sem culpa, que alguém considera inimigos a serem eliminados”. É bárbaro!
Não tenho nenhuma simpatia por grupos terroristas, muito menos por partidos que vencem eleição e, ao invés de tentar promover a paz, provocam a guerra e praticam crimes, como fez o Hamas. No entanto, a ação do governo de Israel, e em particular do seu primeiro ministro, é terrorista e prejudicial historicamente aos Judeus. Israel nunca esteve tão isolada no mundo nestes últimos 77 anos e a causa do Estado Palestino nunca foi tão apoiada como atualmente. Parte deste cenário é fruto das políticas de Netanyahu e da extrema direta de Israel, que não esconde o seu desejo de, a qualquer custo, “limpar” a região do povo palestino, dando razão àqueles que qualifica estas ações como genocidas. Não podemos confundir Israel ou os judeus com o genocídio, como, durante a segunda guerra, não poderíamos confundir a Itália ou os italianos com o fascismo.
A situação na Faixa de Gaza, que tem apenas 365 Km² e uma população de quase 2 milhões e 500 mil pessoas, é muito complexa. Este território e a região do que hoje é a Cisjordânia, juntos formam o que seria o Estado Palestino, foi disputado ao longo destes últimos 6 mil anos, mesmo antes da fundação da cidade de Gaza pelos Filisteus, por judeus da Judéia, assírios babilônios, persas macedônios romanos entre outros; e, finalmente, pelo Império Britânico, que no século XX, logo depois da primeira guerra, prometeu ao movimento sionista, criar um Estado para o povo judeu, que apesar de perseguido por diversos reinos e religiões não perdera a sua identidade e desejo de voltar a palestina e a Jerusalém. Reivindicação humana e justa para o povo do “Sion”. Na Palestina também habitava, há milênios, o povo chamado de palestino, pelo menos, desde a dominação de Alexandre e que depois da derrota do império otomano, também reivindicava e tinha direito ao seu Estado. Paulatinamente, depois da morte de Maomé, os palestinos passaram, em sua maioria, a assumir a religião islâmica. Jerusalém era, igualmente, cidade sagrada para três religiões monoteístas: os cristãos católicos, que pegaram em armas nas cruzadas para dominá-la; os muçulmanos, religião atual da maioria dos árabes palestinos; e os judeus, uma das religiões monoteístas mais antigas, que remonta aos tempos de bíblicos de Abraão.
A situação é deveras complexa, para além das contendas econômicas, sociais e políticas, tem um elemento forte: o religioso. A Inglaterra vitoriosa na primeira guerra, dividira a região em dois protetorados, um judeu e outro palestino, e prometera aos judeus a constituição do seu Estado tão sonhado. Em novembro de 1947, a ONU, recém criada, recomendou a divisão da Palestina em dois Estados: um Israel que foi constituído meses depois; o outro o Estado da Palestina que até hoje não existe como Estado; A ONU, também definiu que Jerusalém, sem considerar que por quase 700 anos a cidade esteve sob domínio muçulmano, seria administrada pelas Nações Unidas, o que foi rejeitado pelos árabes, tivemos de 1947 a 1948 a primeira das guerras Israelo-Palestina. Depois desta guerra Jerusalém foi dividida em duas zonas, a ocidental, pertencente a Israel, e a oriental, sob controle da Jordânia. Desde então o cenário da região é de escaramuças, conflitos e guerra declarada, com expansão paulatina e permanente de Israel. Em 1967, Israel ocupou a Zona oriental de Jerusalém, anexou ao seu território as colinas de Golã, na Síria, e se transformou na maior potência bélica do oriente médio, mas isso é tema para outro artigo.
Voltando à Guerra na Faixa de Gaza, o método Netanyahu para exterminar o Hamas, parece mais um aríete para sua auto afirmação, pois antes da guerra ele enfrentava denúncias de corrupção, queda de popularidade e uma certa resistência dentro do seu próprio governo. A guerra lhe trouxe um alento, mas as negociações de paz, a libertação dos reféns, hoje, depende muito mais das pressões externas do que das iniciativas do primeiro Ministro, ele quer guerra, porém acreditava que iria resolver rapidamente a luta contra o Hamas. Errou.
Hoje, a solução para os conflitos nesta parte do mundo é complicada. Israel tem quase 10 milhões de habitantes e calcula-se que outros 7 milhões de palestinos convivam, senão no território de Israel, no seu entorno; a Faixa de Gaza já estava, antes da guerra cercada de muros, sob o controle de Israel e somente 20 mil moradores podiam sair para trabalhar; na Cisjordânia, território que seria do Estado Palestino, estão instalados 750 mil colonos israelenses. A solução deste grave quadro mundial, extrapola em muito os conflitos israelo-palestino, requer participação ativa comunidade árabe e da, mesmo combalida, ONU. No cenário da geopolítica mundial é difícil enxergar uma luz no final do túnel, até a solução de um único Estado não pode ser desconsiderada.
Estamos diante de uma grande questão de pouco horizonte para a solução que é o Estado palestino e uma crise humanitária imensa, decorrente da política beligerante que motiva o governo de Israel.
Todos que defendem um mundo melhor, mais humano e mais justo, independentemente de ser de direita, de centro, de esquerda ou da religião que professa, não podem se calar diante de uma mortandade cruel como a que está sofrendo a população civil da faixa de Gaza.
Cada um do seu jeito que se manifeste. Quem cala consente!
Texto do ex-deputado federal Candido Vaccarezza publicado no site Poder 360 dia 02/06/25
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